Tomar partido I
O Miguel prossegue a sua vigilância às reacções mais-ou-menos-contra ou mais-ou-menos-a-favor das declarações de Santo Villas-Boas [mal aproveitado nome]. Deixo os débitos de legalismo de Rita Lobo Xavier para quem tenha mais competências que eu e passo já ao texto de Carlos Amaral Dias. Concordo com o Miguel na redução do artigo ao "cientifismo", no aspecto em que Carlos Amaral Dias pode expôr as suas convicções sem assim diminuir as legítimas exigências de demissão - baseadas exactamente no preconceito e na falta de credibilidade científica que as malfadadas declarações revelam - sem diminuir, dizia, a actuação de quem não é necessariamente cientista, mas antes cidadão, activista, actor dos movimentos sociais sem os quais os cientistas falariam para o boneco. O dito senhor tem responsabilidades de topo na adopção em Portugal, ocupa um cargo público, fala com base em preconceitos morais e ideológicos, contrariando praticamente todos os discursos científicos relativos à questão. Caro Professor, se isto não é motivo para uma demissão, não sei o que seria.
Mas para mim, e ao contrário do que pretende o Miguel, Amaral Dias acaba por tomar partido, subtilmente, sem compromisso, com base na verdade possível que o pensamento esclarecido e em evolução pode ir alcançando. A ciência toma partidos, se não não é ciência. Toma partido pela procura ao invés do obscurantismo, pela investigação ao invés do preconceito, pela honestidade, pela clareza, pela simplicidade e pela lógica. E digo mais: no seu "e mais não digo" está o partido que não tem coragem de tomar, porque o imprescindível exercício rigoroso da razão não se pode esgotar em si mesmo. Ou não é rigoroso. É oco.