segunda-feira, janeiro 31, 2005
E é por isto que a minha decisão está tomada.
"Quem vai agora votar no Bloco é porque quer ver no Parlamento as vozes para defender estas políticas [sociais e económicas] no sentido de torná-las maioritárias."
Francisco Louçã, há pouco na entrevista com Judite de Sousa na RTP1
"Quem vai agora votar no Bloco é porque quer ver no Parlamento as vozes para defender estas políticas [sociais e económicas] no sentido de torná-las maioritárias."
Francisco Louçã, há pouco na entrevista com Judite de Sousa na RTP1
Perguntas com destinatário
Some say that love's a little boy
And some say it's a bird,
Some say it makes the world go round,
And some say that's absurd,
And when I asked the man next-door,
Who looked as if he knew,
His wife got very cross indeed,
And said it wouldn't do.
Does it look like a pair of pyjamas,
Or the ham in a temperance hotel?
Does its odour remind one of llamas,
Or has it a comforting smell?
Is it prickly to touch as a hedge is,
Or soft as eiderdown fluff?
Is it sharp or quite smooth at the edges?
O tell me the truth about love.
Our history books refer to it
In cryptic little notes,
It's quite a common topic on
The Transatlantic boats;
I've found the subject mentioned in
Accounts of suicides,
And even seen it scribbled on
The backs of raikway-guides.
Does it howl like a hungry Alsatian,
Or boom like a military band?
Could one give a first-rate imitation
On a saw or a Steinway Grand?
Is its singing at parties a riot?
Does it only like Classical stuff?
Will it stop when one wants to be quiet?
O tell me the truth about love.
I looked inside the summer-house;
It wasn't ever there;
I tried the Thames at Maidenhead,
And Brighton's bracing air.
I don't know what the blackbird sang,
Or what the tulip said,
But it wasn't in the chicken-run,
Or underneath the bed.
Can it pull extraordinary faces?
Is it usually sick on a swing?
Does it spend all its time at the races,
Or fiddling with pieces of string?
Has it views of its own about money?
Does it think Patriotism enough?
Are its stories vulgar but funny?
O tell me the truth about love.
When it comes, will it come without warning
Just as I'm picking my nose?
Will it knock on my door in the morning,
Or tread in the bus on my toes?
Will it come like a change in the weather?
Will its greeting be courteous or rough?
Will it alter my life altogether?
O tell me the truth about love.
W H Auden, Tell Me the Truth About Love, XII Songs
Some say that love's a little boy
And some say it's a bird,
Some say it makes the world go round,
And some say that's absurd,
And when I asked the man next-door,
Who looked as if he knew,
His wife got very cross indeed,
And said it wouldn't do.
Does it look like a pair of pyjamas,
Or the ham in a temperance hotel?
Does its odour remind one of llamas,
Or has it a comforting smell?
Is it prickly to touch as a hedge is,
Or soft as eiderdown fluff?
Is it sharp or quite smooth at the edges?
O tell me the truth about love.
Our history books refer to it
In cryptic little notes,
It's quite a common topic on
The Transatlantic boats;
I've found the subject mentioned in
Accounts of suicides,
And even seen it scribbled on
The backs of raikway-guides.
Does it howl like a hungry Alsatian,
Or boom like a military band?
Could one give a first-rate imitation
On a saw or a Steinway Grand?
Is its singing at parties a riot?
Does it only like Classical stuff?
Will it stop when one wants to be quiet?
O tell me the truth about love.
I looked inside the summer-house;
It wasn't ever there;
I tried the Thames at Maidenhead,
And Brighton's bracing air.
I don't know what the blackbird sang,
Or what the tulip said,
But it wasn't in the chicken-run,
Or underneath the bed.
Can it pull extraordinary faces?
Is it usually sick on a swing?
Does it spend all its time at the races,
Or fiddling with pieces of string?
Has it views of its own about money?
Does it think Patriotism enough?
Are its stories vulgar but funny?
O tell me the truth about love.
When it comes, will it come without warning
Just as I'm picking my nose?
Will it knock on my door in the morning,
Or tread in the bus on my toes?
Will it come like a change in the weather?
Will its greeting be courteous or rough?
Will it alter my life altogether?
O tell me the truth about love.
W H Auden, Tell Me the Truth About Love, XII Songs
sexta-feira, janeiro 28, 2005
Corrente da Felicidade Díldica
Abomino chain letters. Sou incapaz de reenviar uma que seja, nem sequer aquelas de acender velinhas pelas alminhas mais recentemente transubstanciadas pelos açoites do mundo. Agora, perdoem-me os contemplados por mim nesta corrente, questionários eu curto. E nestas coisas fica sempre bem um pouco de desresponsabilização, portanto: A culpada é a Sara! Eheheh...
1. Have you ever used toys or other things during sex?
Para lá do Castelo do Prazer? Sinceramente, não tenho a certeza... quando invento muito o estado é quase sempre pré-amnésico... Calculo que o Duke, o urso de peluche gigante que teve lugar cativo na minha cama durante muitos anos, não conte. Lá que assistiu a muita coisa... Mas o que me baralhou mesmo nesta questão foi essa cena do "other things". Other than what?
2. Would you consider using dildos or other sexual toys in the future?
O futuro só à líbido pertence... ;)
3. What is your kinkiest fantasy you have yet to realize?
Posso só adiantar, para desenganar eventuais interessados*, que o sexo virtual não me entusiasma muito...
4. Who gave you this dildo?
Ó Sara, esta última quer dizer que tens uma prenda para mim?...
*Entre os quais se encontram provavelmente aqueles que se metem pelo Google para pesquisar em "Manel da Truta"+"Homossexual"... :p
E os felizes contemplados com esta corrente da felicidade são:
.Abaixo de Cão
.Katraponga
.Miguel
.Boss
Abomino chain letters. Sou incapaz de reenviar uma que seja, nem sequer aquelas de acender velinhas pelas alminhas mais recentemente transubstanciadas pelos açoites do mundo. Agora, perdoem-me os contemplados por mim nesta corrente, questionários eu curto. E nestas coisas fica sempre bem um pouco de desresponsabilização, portanto: A culpada é a Sara! Eheheh...
1. Have you ever used toys or other things during sex?
Para lá do Castelo do Prazer? Sinceramente, não tenho a certeza... quando invento muito o estado é quase sempre pré-amnésico... Calculo que o Duke, o urso de peluche gigante que teve lugar cativo na minha cama durante muitos anos, não conte. Lá que assistiu a muita coisa... Mas o que me baralhou mesmo nesta questão foi essa cena do "other things". Other than what?
2. Would you consider using dildos or other sexual toys in the future?
O futuro só à líbido pertence... ;)
3. What is your kinkiest fantasy you have yet to realize?
Posso só adiantar, para desenganar eventuais interessados*, que o sexo virtual não me entusiasma muito...
4. Who gave you this dildo?
Ó Sara, esta última quer dizer que tens uma prenda para mim?...
*Entre os quais se encontram provavelmente aqueles que se metem pelo Google para pesquisar em "Manel da Truta"+"Homossexual"... :p
E os felizes contemplados com esta corrente da felicidade são:
.Abaixo de Cão
.Katraponga
.Miguel
.Boss
quinta-feira, janeiro 27, 2005
Há sessenta anos...
desenho de Sala Smulevic a partir dos relatos do pai, Serge
...invertida a marcha da morte...
Auschwitz, Janeiro de 1945
...veio o tempo de reaprender a vida.
desenho de Sala Smulevic a partir dos relatos do pai, Serge
...invertida a marcha da morte...
Auschwitz, Janeiro de 1945
...veio o tempo de reaprender a vida.
terça-feira, janeiro 25, 2005
E não é evidente? Quem acredita que um penedo caia com a mesma rapidez que um botão de camisa ou que um seixo da praia? Esta era a inteligência que dEus nos deu...
Pois que todos, enquanto somos como somos, sem o saber, levamos as nossas vidas de civilizados numa confusão de facto insensata de religiões jamais inteiramente mortas e raro inteiramente compreendidas e praticadas; de morais outrora exclusivas, mas que se sobrepõem ou se combinam no pano de fundo dos nossos comportamentos elementares; de complexos ignorados, mas por isso tanto mais activos; e de instintos herdados, bem menos de qualquer natureza animal que de costumes totalmente esquecidos, que se tornaram traços ou cicatrizes mentais, inconscientes e, por esse motivo, facilmente confundidos com o instinto. Que foram, ora artifícios cruéis, ora ritos sagrados ou gestos mágicos, por vezes também disciplinas profundas elaboradas por místicas longínquas simultaneamente no tempo e no espaço.
Denis de Rougemont, in O Amor e o Ocidente, Trad. Anna Hatherly, Vega
Pois que todos, enquanto somos como somos, sem o saber, levamos as nossas vidas de civilizados numa confusão de facto insensata de religiões jamais inteiramente mortas e raro inteiramente compreendidas e praticadas; de morais outrora exclusivas, mas que se sobrepõem ou se combinam no pano de fundo dos nossos comportamentos elementares; de complexos ignorados, mas por isso tanto mais activos; e de instintos herdados, bem menos de qualquer natureza animal que de costumes totalmente esquecidos, que se tornaram traços ou cicatrizes mentais, inconscientes e, por esse motivo, facilmente confundidos com o instinto. Que foram, ora artifícios cruéis, ora ritos sagrados ou gestos mágicos, por vezes também disciplinas profundas elaboradas por místicas longínquas simultaneamente no tempo e no espaço.
Denis de Rougemont, in O Amor e o Ocidente, Trad. Anna Hatherly, Vega
Juro-vos que há pouco...
... ainda com as cores do ocaso reflectidas no retrovisor e com a Love Song dos Cure no rádio, ao deparar subitamente com a lua sob a ponte até me faltou o ar.
... ainda com as cores do ocaso reflectidas no retrovisor e com a Love Song dos Cure no rádio, ao deparar subitamente com a lua sob a ponte até me faltou o ar.
segunda-feira, janeiro 24, 2005
Então isto é que é a vaga de frio?...*
É sempre a mesma coisa, pá! Prometeram-nos um combinado Zanussi, acabámos com uma geleira Camping Gaz...
* Post a ser encarado, por cortesia para com as origens sub-urbanas do autor, da perspectiva pequeno-burguesa de quem pode usufruir de um abrigo minimamente confortável para se proteger disto que eu digo que não é frio.
É sempre a mesma coisa, pá! Prometeram-nos um combinado Zanussi, acabámos com uma geleira Camping Gaz...
* Post a ser encarado, por cortesia para com as origens sub-urbanas do autor, da perspectiva pequeno-burguesa de quem pode usufruir de um abrigo minimamente confortável para se proteger disto que eu digo que não é frio.
domingo, janeiro 23, 2005
Não somos os últimos. Outros morrerão em circunstâncias comparáveis.
sobrevivente de Auschwitz visto por Sala, filha do deportado Serge Smulevic
...Também na Pública.
sobrevivente de Auschwitz visto por Sala, filha do deportado Serge Smulevic
...Também na Pública.
Os budistas têm razão. A meditação altera o funcionamento do cérebro, podendo mesmo modificá-lo em termos físicos.
A Pública de hoje fala-nos das recentes conclusões a que chegaram os cientistas que conseguiram do Dalai Lama a colaboração numa experiência, digamos, "exploratória" da meditação. No centro de ioga que frequento não é raro comentar-se com humor estas "descobertas" da ciência acerca do que tradicionalmente se tende a encarar como algo não-científico, mesmo raiando o sobrenatural, misterioso e provavelmente mentiroso - à primeira vista, pelo menos, e sob uma encandeante luz de racionalismo ocidental. Uma prova deste pensamento resistente e pedante é a inexistência de uma interacção efectiva nos sistemas de saúde entre as medicinas do mundo, por mais provas dadas e reiteradas de que a cura, a prevenção e o bem-estar estão longe de se esgotar na medicinal tradicional do Ocidente. Mesmo assim vamos tendo um ou outro médico que na privacidade do consultório de pedigree tem a clarividência de encaminhar um doente para shiatsu ou ioga, para um osteopata ou um acunpunctor. Mas sempre pela porta do cavalo, sempre oficiosamente, claro, somos profissionais académicos e respeitáveis.
Mas redigo que a luz racionalista tem de ser absolutamente branca e ofuscante para que a negação seja a resposta-padrão a tudo o que não traz o selo validante de um laboratório oficial europeu ou americano. Qualquer pessoa que tenha com disponiblidade experimentado a troca de energias de uma massagem shiatsu vai ter uma extrema dificuldade em ironizar sobre a noção de chakra, por exemplo. Alguém que seja muito incipientemente treinado na meditação já experimentou o suficiente para intuir, pelo menos, a imensidão de portas que o cérebro revela por abrir, e consequentemente poderá e deverá ter a visão e a humildade de deduzir que se para o iniciado isto é subitamente claro, no caso do Mestre - para manter as terminologias - há um longo caminho já percorrido e incontáveis portas já abertas... mesmo que apenas para novos corredores de portas cerradas.
A ciência ocidental descobriu, finalmente, que a meditação transforma o cérebro - ou talvez apenas a ciência tenha até hoje ignorado a meditação no rol de coisas que o podem afectar positiva ou negativamente, como o sono, a cor, o olfacto, a música, a luminosidade, enfim, já estou a especular. A notícia só me espanta por tardia. Mas se como ocidental sinto que devo a mim mesm@ uma auto-crítica constante e construtiva e por tal corre-me o dedo a zombar da bem-vinda descoberta de David Richardson que La Pallice não desdenharia, como human@ não posso deixar de atentar num ponto que de pequeno tem pouco: duvido que há cem anos atrás uma vintena de monges se submetesse a meditar com 250 sensores eléctricos acoplados à mona. Assim até eu digo: que bela é a globalização!
A Pública de hoje fala-nos das recentes conclusões a que chegaram os cientistas que conseguiram do Dalai Lama a colaboração numa experiência, digamos, "exploratória" da meditação. No centro de ioga que frequento não é raro comentar-se com humor estas "descobertas" da ciência acerca do que tradicionalmente se tende a encarar como algo não-científico, mesmo raiando o sobrenatural, misterioso e provavelmente mentiroso - à primeira vista, pelo menos, e sob uma encandeante luz de racionalismo ocidental. Uma prova deste pensamento resistente e pedante é a inexistência de uma interacção efectiva nos sistemas de saúde entre as medicinas do mundo, por mais provas dadas e reiteradas de que a cura, a prevenção e o bem-estar estão longe de se esgotar na medicinal tradicional do Ocidente. Mesmo assim vamos tendo um ou outro médico que na privacidade do consultório de pedigree tem a clarividência de encaminhar um doente para shiatsu ou ioga, para um osteopata ou um acunpunctor. Mas sempre pela porta do cavalo, sempre oficiosamente, claro, somos profissionais académicos e respeitáveis.
Mas redigo que a luz racionalista tem de ser absolutamente branca e ofuscante para que a negação seja a resposta-padrão a tudo o que não traz o selo validante de um laboratório oficial europeu ou americano. Qualquer pessoa que tenha com disponiblidade experimentado a troca de energias de uma massagem shiatsu vai ter uma extrema dificuldade em ironizar sobre a noção de chakra, por exemplo. Alguém que seja muito incipientemente treinado na meditação já experimentou o suficiente para intuir, pelo menos, a imensidão de portas que o cérebro revela por abrir, e consequentemente poderá e deverá ter a visão e a humildade de deduzir que se para o iniciado isto é subitamente claro, no caso do Mestre - para manter as terminologias - há um longo caminho já percorrido e incontáveis portas já abertas... mesmo que apenas para novos corredores de portas cerradas.
A ciência ocidental descobriu, finalmente, que a meditação transforma o cérebro - ou talvez apenas a ciência tenha até hoje ignorado a meditação no rol de coisas que o podem afectar positiva ou negativamente, como o sono, a cor, o olfacto, a música, a luminosidade, enfim, já estou a especular. A notícia só me espanta por tardia. Mas se como ocidental sinto que devo a mim mesm@ uma auto-crítica constante e construtiva e por tal corre-me o dedo a zombar da bem-vinda descoberta de David Richardson que La Pallice não desdenharia, como human@ não posso deixar de atentar num ponto que de pequeno tem pouco: duvido que há cem anos atrás uma vintena de monges se submetesse a meditar com 250 sensores eléctricos acoplados à mona. Assim até eu digo: que bela é a globalização!
sexta-feira, janeiro 21, 2005
Programa para o fim-de-semana
-Senhores, apraz-vos escutar um belo conto de amor e de morte?...
-Nada no mundo poderia agradar-nos mais.
(...)Que o acordo do amor e da morte seja aquele que provoca em nós as ressonâncias mais profundas, é um facto que à primeira vista estabelece o prodigioso êxito do romance. Mas há outras razões mais secretas, para aí vermos como que uma definição da consciência ocidental...
Amor e morte, amor mortal: se não é toda a poesia é, pelo menos, tudo o que há de popular, tudo o que há de universalmente comovente em nossas literaturas, e nas nossas mais antigas lendas, e nas nossas mais belas canções. O amor feliz não tem história. Só existem romances de amor mortal, isto é, do amor ameaçado e condenado pela própria vida. O que exalta o lirismo ocidental não é o prazer dos sentidos nem a paz fecunda do casal. É menos o amor realizado que a paixão de amor. E paixão significa sofrimento. Eis o facto fundamental.
Mas o entusiasmo que mostramos pelo romance (...), o erotismo idealizado em toda a nossa cultura, na nossa educação, nas imagens que são o ornamento de nossas vidas, e, finalmente, a necessidade de evasão exasperada pelo tédio mecânico, tudo em nós e à nossa volta glorifica a tal ponto a paixão que acabamos por ver nela uma promessa de vida mais viva, uma força que transfigura, qualquer coisa que estaria para além da felicidade e do sofrimento, uma ardente bem-aventurança.
Na «paixão» já não sentimos «o que sofre» mas «o que é apaixonante». E, todavia, a paixão de amor significa, de facto, uma infelicidade. A sociedade em que vivemos e cujos costumes não mudaram, sob este aspecto, através dos séculos, reduz o amor-paixão, em nove de cada dez casos, a revestir a forma de adultério. E pressupondo embora que os amantes invocarão todos os casos de excepção, a estatística é cruel: refuta a nossa poesia.
Viveremos nós em tal ilusão, em tal «mistificação», que esqueçamos verdadeiramente essa infelicidade? Ou devemos acreditar que em segredo preferimos o que nos magoa àquilo que pareceria satisfazer o nosso ideal de vida harmoniosa?
(...) Afirmar que o amor-paixão significa, de facto, o adultério, é insistir na realidade que o nosso culto de amor mascara e simultaneamente transfigura; é pôr em evidência o que esse culto dissimula, recalca e se recusa a dar nome para nos permitir um abandono ardente àquilo que não ousaríamos reivindicar. A própria resistência que o leitor oporá ao reconhecimento de que a paixão e adultério se confundem*, o mais das vezes, na sociedade que é a nossa, não será uma primeira prova deste facto paradoxal: que queremos a paixão e a infelicidade desde que nunca confessemos que as queremos pelo que são?
Para quem nos julgasse através das nossas literaturas, o adultério pareceria uma das ocupações mais notáveis a que os ocidentais se entregam. Rapidamente se elaboraria a lista dos romances que a ele não fazem qualquer alusão; e o exito obtido pelos outros, a complacência que despertam, a própria paixão empregada, por vezes, a combatê-los, tudo isso elucida bastante sobre os sonhos dos casais num regime que fez do casamento um dever e uma comodidade. Sem adultério, que seriam todas as nossas literaturas? Elas vivem da «crise do casamento». É provável também que a mantenham, seja porque «cantam» em prosa e em verso o que a religião considera como um crime e a Lei como uma contravenção; seja, pelo contrário, porque daí extraem um repertório inesgotável de situações cómicas ou cínicas. Direito divino da paixão, psicologia mundana, êxito do «triângulo» no teatro - quer se idealize, se subtilize ou ironize, que se faz senão trair o tormento inumerável e obcecante do amor em ruptura com a lei? Não será uma procura de evasão da sua horrível realidade? Dar à situação um aspecto de mística ou fazer dela uma farsa é sempre confessar que ela é insuportável... Mal-casados, decepcionados, revoltados, exaltados ou cínicos, infiéis ou enganados: quer na realidade ou em sonhos, no remorso ou no receio, no prazer da revolta ou na ansiedade da tentação, há pouca gente que se não reconheça pelo menos numa destas categorias. Renúncias, compromissos, rupturas, neurastenias, confusões irritantes e mesquinhas de sonhos, de obrigações, de secretas complacências - metade da infelicidade humana se resume na palavra adultério. Apesar de todas as nossas literaturas - ou talvez por causa delas, justamente - pode parecer por vezes que não se disse ainda nada sobre a realidade dessa infelicidade. E que certas questões das mais ingénuas, neste domínio, tenham sido mais das vezes resolvidas do que propostas...**
Por exemplo o mal verificado: deve a culpa ser lançada sobre a instituição do casamento ou, pelo contrário, sobre «qualquer coisa» que a arruine no próprio cerne das nossas ambições? Será, de facto, como muitos o pensam, a chamada concepção «cristã» do casamento que causa todo o nosso tormento ou, pelo contrário, será uma concepção do amor que não vimos que irá talvez tornar esse laço, desde o início, insuportável?
Verifico que o Ocidental ama pelo menos tanto aquilo que destrói como o que «assegura a felicidade dos cônjuges». Donde pode vir uma tal contradição? Se o segredo da crise do casamento é simplesmente a atracção do proibido, donde nos vem esse gosto da infelicidade? Que ideia de amor trairá ele? Que segredo da nossa existência, do nosso espírito, talvez da nossa história?
Denis de Rougemont, O Amor e o Ocidente, Livro I - O mito de Tristão, 1938 [revisão do próprio autor no pós-guerra], Trad. Anna Hatherly, Vega 1999
Ora bem, ainda só comecei, mas não temo o risco de dizer que me espera um fim-de-semana apaixonante.
*nota da T.: sacaninha, o gajo, hã?...
**a nossa eterna mania de encontrar - e se for caso disso inventar - respostas a todo o custo...
-Senhores, apraz-vos escutar um belo conto de amor e de morte?...
-Nada no mundo poderia agradar-nos mais.
(...)Que o acordo do amor e da morte seja aquele que provoca em nós as ressonâncias mais profundas, é um facto que à primeira vista estabelece o prodigioso êxito do romance. Mas há outras razões mais secretas, para aí vermos como que uma definição da consciência ocidental...
Amor e morte, amor mortal: se não é toda a poesia é, pelo menos, tudo o que há de popular, tudo o que há de universalmente comovente em nossas literaturas, e nas nossas mais antigas lendas, e nas nossas mais belas canções. O amor feliz não tem história. Só existem romances de amor mortal, isto é, do amor ameaçado e condenado pela própria vida. O que exalta o lirismo ocidental não é o prazer dos sentidos nem a paz fecunda do casal. É menos o amor realizado que a paixão de amor. E paixão significa sofrimento. Eis o facto fundamental.
Mas o entusiasmo que mostramos pelo romance (...), o erotismo idealizado em toda a nossa cultura, na nossa educação, nas imagens que são o ornamento de nossas vidas, e, finalmente, a necessidade de evasão exasperada pelo tédio mecânico, tudo em nós e à nossa volta glorifica a tal ponto a paixão que acabamos por ver nela uma promessa de vida mais viva, uma força que transfigura, qualquer coisa que estaria para além da felicidade e do sofrimento, uma ardente bem-aventurança.
Na «paixão» já não sentimos «o que sofre» mas «o que é apaixonante». E, todavia, a paixão de amor significa, de facto, uma infelicidade. A sociedade em que vivemos e cujos costumes não mudaram, sob este aspecto, através dos séculos, reduz o amor-paixão, em nove de cada dez casos, a revestir a forma de adultério. E pressupondo embora que os amantes invocarão todos os casos de excepção, a estatística é cruel: refuta a nossa poesia.
Viveremos nós em tal ilusão, em tal «mistificação», que esqueçamos verdadeiramente essa infelicidade? Ou devemos acreditar que em segredo preferimos o que nos magoa àquilo que pareceria satisfazer o nosso ideal de vida harmoniosa?
(...) Afirmar que o amor-paixão significa, de facto, o adultério, é insistir na realidade que o nosso culto de amor mascara e simultaneamente transfigura; é pôr em evidência o que esse culto dissimula, recalca e se recusa a dar nome para nos permitir um abandono ardente àquilo que não ousaríamos reivindicar. A própria resistência que o leitor oporá ao reconhecimento de que a paixão e adultério se confundem*, o mais das vezes, na sociedade que é a nossa, não será uma primeira prova deste facto paradoxal: que queremos a paixão e a infelicidade desde que nunca confessemos que as queremos pelo que são?
Para quem nos julgasse através das nossas literaturas, o adultério pareceria uma das ocupações mais notáveis a que os ocidentais se entregam. Rapidamente se elaboraria a lista dos romances que a ele não fazem qualquer alusão; e o exito obtido pelos outros, a complacência que despertam, a própria paixão empregada, por vezes, a combatê-los, tudo isso elucida bastante sobre os sonhos dos casais num regime que fez do casamento um dever e uma comodidade. Sem adultério, que seriam todas as nossas literaturas? Elas vivem da «crise do casamento». É provável também que a mantenham, seja porque «cantam» em prosa e em verso o que a religião considera como um crime e a Lei como uma contravenção; seja, pelo contrário, porque daí extraem um repertório inesgotável de situações cómicas ou cínicas. Direito divino da paixão, psicologia mundana, êxito do «triângulo» no teatro - quer se idealize, se subtilize ou ironize, que se faz senão trair o tormento inumerável e obcecante do amor em ruptura com a lei? Não será uma procura de evasão da sua horrível realidade? Dar à situação um aspecto de mística ou fazer dela uma farsa é sempre confessar que ela é insuportável... Mal-casados, decepcionados, revoltados, exaltados ou cínicos, infiéis ou enganados: quer na realidade ou em sonhos, no remorso ou no receio, no prazer da revolta ou na ansiedade da tentação, há pouca gente que se não reconheça pelo menos numa destas categorias. Renúncias, compromissos, rupturas, neurastenias, confusões irritantes e mesquinhas de sonhos, de obrigações, de secretas complacências - metade da infelicidade humana se resume na palavra adultério. Apesar de todas as nossas literaturas - ou talvez por causa delas, justamente - pode parecer por vezes que não se disse ainda nada sobre a realidade dessa infelicidade. E que certas questões das mais ingénuas, neste domínio, tenham sido mais das vezes resolvidas do que propostas...**
Por exemplo o mal verificado: deve a culpa ser lançada sobre a instituição do casamento ou, pelo contrário, sobre «qualquer coisa» que a arruine no próprio cerne das nossas ambições? Será, de facto, como muitos o pensam, a chamada concepção «cristã» do casamento que causa todo o nosso tormento ou, pelo contrário, será uma concepção do amor que não vimos que irá talvez tornar esse laço, desde o início, insuportável?
Verifico que o Ocidental ama pelo menos tanto aquilo que destrói como o que «assegura a felicidade dos cônjuges». Donde pode vir uma tal contradição? Se o segredo da crise do casamento é simplesmente a atracção do proibido, donde nos vem esse gosto da infelicidade? Que ideia de amor trairá ele? Que segredo da nossa existência, do nosso espírito, talvez da nossa história?
Denis de Rougemont, O Amor e o Ocidente, Livro I - O mito de Tristão, 1938 [revisão do próprio autor no pós-guerra], Trad. Anna Hatherly, Vega 1999
Ora bem, ainda só comecei, mas não temo o risco de dizer que me espera um fim-de-semana apaixonante.
*nota da T.: sacaninha, o gajo, hã?...
**a nossa eterna mania de encontrar - e se for caso disso inventar - respostas a todo o custo...
quinta-feira, janeiro 20, 2005
Quando um velho desiste de viver...
... os gestos em volta tornam-se perdidos e confusos, os passos são tacteantes e os toques receosos. Quando um velho desiste de viver a casa percebe, mas não necessariamente os que a habitam, desolados com o tempo que avança, zangados com a colaboração ausente daquele que querem amarrar à vida. Quando um velho finalmente deixa de viver o coração chora pelos olhos secos, as crianças gritam nervosas e ganham medo aos corredores, a culpa de tudo o que se fez e se deixou de fazer insinua-se, venenosa, insidiosa, carunchosa. É a vida, pensamos. Era o tempo, se nada houve que fizesse precipitar tudo em tão poucos dias. Mas mais poderíamos ter feito para que a vida merecesse luta. Mais poderíamos ter oferecido para que os tempos em tempos fossem mais felizes. E sob o sol e entre as campas se sussurra mea maxima culpa e se mascara por momentos a consciência de que se viveste interiormente sozinho e em perene zanga e censura com quem te rodeia é certo que assim morrerás e essa fantasiosa culpa deve morrer a teu lado. Solteira.
Quando um velho decide morrer as vidas pesadas pesam tanto que se tornam leves e os dias futuros revelam-se como páginas brancas aguardando a nossa caligrafia.
... os gestos em volta tornam-se perdidos e confusos, os passos são tacteantes e os toques receosos. Quando um velho desiste de viver a casa percebe, mas não necessariamente os que a habitam, desolados com o tempo que avança, zangados com a colaboração ausente daquele que querem amarrar à vida. Quando um velho finalmente deixa de viver o coração chora pelos olhos secos, as crianças gritam nervosas e ganham medo aos corredores, a culpa de tudo o que se fez e se deixou de fazer insinua-se, venenosa, insidiosa, carunchosa. É a vida, pensamos. Era o tempo, se nada houve que fizesse precipitar tudo em tão poucos dias. Mas mais poderíamos ter feito para que a vida merecesse luta. Mais poderíamos ter oferecido para que os tempos em tempos fossem mais felizes. E sob o sol e entre as campas se sussurra mea maxima culpa e se mascara por momentos a consciência de que se viveste interiormente sozinho e em perene zanga e censura com quem te rodeia é certo que assim morrerás e essa fantasiosa culpa deve morrer a teu lado. Solteira.
Quando um velho decide morrer as vidas pesadas pesam tanto que se tornam leves e os dias futuros revelam-se como páginas brancas aguardando a nossa caligrafia.
terça-feira, janeiro 18, 2005
Para o K. e o Opiniões
E para todos os que compreendem a necessidade vital de caminhar, de respirar, de sair. Para quem é um alívio não ser definido pelos móveis da casa e pelo carro à porta. Para quem o mundo é um angustioso e maravilhoso mistério à espera de sucessivos e deslumbrados mergulhos. A liberdade é uma maluca que sabe quanto vale um beijo, não é verdade?
Tira a mão do queixo, não penses mais nisso
O que lá vai já deu o que tinha a dar
Quem ganhou, ganhou e usou-se disso
Quem perdeu há-de ter mais cartas para dar
E enquanto alguns fazem figura
Outros sucumbem à batota
Chega aonde tu quiseres
Mas goza bem a tua rota
Enquanto houver estrada para andar
A gente vai continuar
Enquanto houver estrada para andar
Enquanto houver ventos e mar
A gente não vai parar
Enquanto houver ventos e mar
Todos nós pagamos por tudo o que usamos
O sistema é antigo e não poupa ninguém, não
Somos todos escravos do que precisamos
Reduz as necessidades se queres passar bem
Que a dependência é uma besta
Que dá cabo do desejo
E a liberdade é uma maluca
Que sabe quanto vale um beijo
Enquanto houver estrada para andar
A gente vai continuar
Enquanto houver estrada para andar
Enquanto houver ventos e mar
A gente não vai parar
Enquanto houver ventos e mar
Jorge Palma, dos álbuns Acto Contínuo e Só
E para todos os que compreendem a necessidade vital de caminhar, de respirar, de sair. Para quem é um alívio não ser definido pelos móveis da casa e pelo carro à porta. Para quem o mundo é um angustioso e maravilhoso mistério à espera de sucessivos e deslumbrados mergulhos. A liberdade é uma maluca que sabe quanto vale um beijo, não é verdade?
Tira a mão do queixo, não penses mais nisso
O que lá vai já deu o que tinha a dar
Quem ganhou, ganhou e usou-se disso
Quem perdeu há-de ter mais cartas para dar
E enquanto alguns fazem figura
Outros sucumbem à batota
Chega aonde tu quiseres
Mas goza bem a tua rota
Enquanto houver estrada para andar
A gente vai continuar
Enquanto houver estrada para andar
Enquanto houver ventos e mar
A gente não vai parar
Enquanto houver ventos e mar
Todos nós pagamos por tudo o que usamos
O sistema é antigo e não poupa ninguém, não
Somos todos escravos do que precisamos
Reduz as necessidades se queres passar bem
Que a dependência é uma besta
Que dá cabo do desejo
E a liberdade é uma maluca
Que sabe quanto vale um beijo
Enquanto houver estrada para andar
A gente vai continuar
Enquanto houver estrada para andar
Enquanto houver ventos e mar
A gente não vai parar
Enquanto houver ventos e mar
Jorge Palma, dos álbuns Acto Contínuo e Só
sexta-feira, janeiro 14, 2005
quinta-feira, janeiro 13, 2005
Publicidade institucional
Hoje o Statler vai lançar o livrito dele na Fnac do Norte Shopping. Como sou um ser humano maravilhoso, apesar de estar a fazer boicote ao livro*, sempre lhe faço publicidade... por isso comprem, deve ser óptimo, não o li nem vou ler, mas pode ser que seja engraçadíssimo.
(* tá aqui uma pessoa a tentar ajudar, oferece-se para escrever um lindo prefácio e é "não, deixa estar, já pedi ao RAP, coitado, depois ele fica triste, e tal...", ofereço-me para fazer uns bonecos para a capa "err.. pois... a capa já está feita, tenho a certeza que farias melhor, mas agora já está"...
não sabem reconhecer o verdadeiro talento, é o que é... humpf!)
Hoje o Statler vai lançar o livrito dele na Fnac do Norte Shopping. Como sou um ser humano maravilhoso, apesar de estar a fazer boicote ao livro*, sempre lhe faço publicidade... por isso comprem, deve ser óptimo, não o li nem vou ler, mas pode ser que seja engraçadíssimo.
(* tá aqui uma pessoa a tentar ajudar, oferece-se para escrever um lindo prefácio e é "não, deixa estar, já pedi ao RAP, coitado, depois ele fica triste, e tal...", ofereço-me para fazer uns bonecos para a capa "err.. pois... a capa já está feita, tenho a certeza que farias melhor, mas agora já está"...
não sabem reconhecer o verdadeiro talento, é o que é... humpf!)
É não perder este espectáculo até ao próximo domingo.
E não venham com o IC 19 e tal e aquilo é fora de Lisboa e não há tempo e o rabo afunda-se no sofá e tenho uma vida muito dura. Ontem à noite demorei vinte minutos a chegar à Teatroesfera e até me enganei no caminho. E se preferirem as desculpas... bom, vocês é que perdem. Perdem seis peças curtas inteligentes, seis jogos de palavras, situações, metáforas, referências e citações que são uma verdadeira trip para o cérebro, seis belíssimos actores e o enorme gosto de ver teatro do melhor. Uma jaula onde três macacos dactilografam até que os seus dedos inadvertidamente os levem a Elsinore, um encontro de desconhecidos em que os tropeções do primeiro reconhecimento são sucessivamente salvos e apagados pelo toque da campainha, uma aula da língua universal Unamunda passeando pelos traumas sociais, pelas aldrabices e pelo amor por fim, uma queda numa Filadélfia em plena Nova Iorque [não tentem perceber, sobretudo se hoje tiverem acordado numa Los Angeles, onde quer que estejam - já eu por exemplo ia gravar de manhã não fosse o som dos martelos pneumáticos a invadir o estúdio, ou seja, acordei claramente numa Cleveland], um Trotsky perplexo com o machado de montanhismo que encontra cravado no próprio crânio e com as péssimas notícias que lhe dá uma enciclopédia de 2004 para o dia de 21 de Agosto de 1940, e por fim um espantoso, divertidíssimo e rigorosíssimo momento musical em que entramos nas crises existenciais de Phillip Glass, a mulher que em tempos amou e um pão de forma [Trutinhas, amigas, aquilo naquele sítio que a gente sabe dava para mês e meio de ensaios com gente em pânico no dia do concerto agarrada ao diapasão - ali havia apenas um pão de forma, provavelmente afinado a 445hz :p]
A Teatroesfera surpreende-me sempre, apaixona-me sempre, enriquece-me sempre. Que mais se pode pedir? Só que o público não passe ao lado.
E não venham com o IC 19 e tal e aquilo é fora de Lisboa e não há tempo e o rabo afunda-se no sofá e tenho uma vida muito dura. Ontem à noite demorei vinte minutos a chegar à Teatroesfera e até me enganei no caminho. E se preferirem as desculpas... bom, vocês é que perdem. Perdem seis peças curtas inteligentes, seis jogos de palavras, situações, metáforas, referências e citações que são uma verdadeira trip para o cérebro, seis belíssimos actores e o enorme gosto de ver teatro do melhor. Uma jaula onde três macacos dactilografam até que os seus dedos inadvertidamente os levem a Elsinore, um encontro de desconhecidos em que os tropeções do primeiro reconhecimento são sucessivamente salvos e apagados pelo toque da campainha, uma aula da língua universal Unamunda passeando pelos traumas sociais, pelas aldrabices e pelo amor por fim, uma queda numa Filadélfia em plena Nova Iorque [não tentem perceber, sobretudo se hoje tiverem acordado numa Los Angeles, onde quer que estejam - já eu por exemplo ia gravar de manhã não fosse o som dos martelos pneumáticos a invadir o estúdio, ou seja, acordei claramente numa Cleveland], um Trotsky perplexo com o machado de montanhismo que encontra cravado no próprio crânio e com as péssimas notícias que lhe dá uma enciclopédia de 2004 para o dia de 21 de Agosto de 1940, e por fim um espantoso, divertidíssimo e rigorosíssimo momento musical em que entramos nas crises existenciais de Phillip Glass, a mulher que em tempos amou e um pão de forma [Trutinhas, amigas, aquilo naquele sítio que a gente sabe dava para mês e meio de ensaios com gente em pânico no dia do concerto agarrada ao diapasão - ali havia apenas um pão de forma, provavelmente afinado a 445hz :p]
A Teatroesfera surpreende-me sempre, apaixona-me sempre, enriquece-me sempre. Que mais se pode pedir? Só que o público não passe ao lado.
1000 Post!
(na verdade até já devemos ter passado essa marca, mas o blogger encravou nos 915 posts já há uns tempos...)
(na verdade até já devemos ter passado essa marca, mas o blogger encravou nos 915 posts já há uns tempos...)
terça-feira, janeiro 11, 2005
E as mulheres que vão esperando...
O PS fala em novo referendo sobre o aborto quando deveria assumir a legalização, pelo menos até às dez semanas, como um dos pontos centrais do seu programa - isto se de facto fosse um partido ligeiramente à esquerda, ligeiramente progressista. Os direitos humanos não são referendáveis. Esta reincidência no referendo quando pela segunda vez [segunda, para sermos simpáticos] tem na mão a possibilidade de resolver definitivamente um problema de saúde pública e dos direitos das mulheres só mostra que este PS não vale um chavelho. Não tem tomates. Não tem identidade. É apenas o Tweedle Dum e a clientela com isso se contenta. Por favor, não caiam no voto [in]útil. É absolutamente imperioso que este partido invertebrado não consiga a maioria absoluta.
O PS fala em novo referendo sobre o aborto quando deveria assumir a legalização, pelo menos até às dez semanas, como um dos pontos centrais do seu programa - isto se de facto fosse um partido ligeiramente à esquerda, ligeiramente progressista. Os direitos humanos não são referendáveis. Esta reincidência no referendo quando pela segunda vez [segunda, para sermos simpáticos] tem na mão a possibilidade de resolver definitivamente um problema de saúde pública e dos direitos das mulheres só mostra que este PS não vale um chavelho. Não tem tomates. Não tem identidade. É apenas o Tweedle Dum e a clientela com isso se contenta. Por favor, não caiam no voto [in]útil. É absolutamente imperioso que este partido invertebrado não consiga a maioria absoluta.
Triste...
... é ter de pedir a um segurança fardado do Metro de Lisboa que apague o cigarro dentro da estação.
... é ter de pedir a um segurança fardado do Metro de Lisboa que apague o cigarro dentro da estação.
Sim, a exclusividade é deles...
... e do Coiso das Neves e do Delgado. Caramba, com uma trupe tão alargada bem que podiam ser simpáticos e admitir mais um saltibanco, para o nosso Jorgito não ficar a chorar pelos cantos, só e abandonado...
... e do Coiso das Neves e do Delgado. Caramba, com uma trupe tão alargada bem que podiam ser simpáticos e admitir mais um saltibanco, para o nosso Jorgito não ficar a chorar pelos cantos, só e abandonado...
segunda-feira, janeiro 10, 2005
Cenas de gajo ou Eduardo Lourenço em tradução para coisos
Muito se tem falado pela blogosfera, nomeadamente nas referências que são o pasto das renas, os nossos tempos e a casa do cacau, sobre o que nesta última se apelidou de política peniana. A este propósito andei a aconselhar vivamente a leitura do artigo de Ana Sá Lopes no Público de ontem. Mas juro que não fiz por mal. Eu pensava que sabia o que pensava. Só hoje lendo o Diário de Notícias percebi que pensava mal.
Percebi finalmente que se estamos hoje como estamos neste país é só porque emborcámos grades de subsídios, apoios, benefícios, incentivos, sem reparar que é com o teu dinheiro que te dão isso. Gastaste anos com parvoíces, como o aborto e a regionalização; deitaste-te tarde a ver a ficção dos reality shows. Depois admiras-te que os parceiros te passem à frente e não tenhas produtividade. Acreditaste nos que te falavam em reduções de horário de trabalho e salários europeus, sem ver que esses países os têm porque trabalham muito para o conseguir. Quiseste fazer estádios e andar nas ruas a abanar bandeirinhas.
Ora aqui @ tenrinh@ nunca se tinha apercebido de que os mais activos defensores da legalização do aborto ou da regionalização [vá lá, os direitos lgbt ficaram de fora das parvoíces, desta vez] fossem precisamente os engrossadores das reais audiências, ora aí está uma novidade. Outra novidade é que tudo isto esteja, para o Abominável Coiso das Neves, directamente ligado ao progresso. Mas esses países mais avançados são, em geral, muito mais liberais em termos de políticas sexuais e reprodutivas, muito mais descentralizados e económicos - no sentido inteligente do termo, não no sentido salazarento - do que o nosso. Então temos aqui um problema: ou eu ou o Coiso das Neves, um de nós vive num mundo paralelo. Por favor, alguém que me tire desta angústia!
Mas o que me deixou mais angustiad@ ainda foi a conclusão deste Não há almoços grátis, novamente um texto com o interesse e a qualidade de uma redacção do ciclo preparatório [partindo do princípio de que falamos de um aluno acima da média, claro...]:
FAZ! Como sempre soubeste fazer. Não por ti, meu caro Portugal, mas pelos portugueses. E deixa dar-te uma novidade não há cá mais ninguém. Só tu, Portugal, podes fazer o desenvolvimento português. Mais ninguém. Os outros falam. Tu ainda cá andarás depois de eles se calarem.
Não há cá mais ninguém, só tu, Portugal? Alguém me explica o que ele quer dizer com isto? Os outros são quem, os estrangeiros? Os que não concordam com o Coiso? Portanto eu sou os outros, logo não faço parte de Portugal? Ou fala-se realmente dessa bela e velha ideia abstracta de Nação que ninguém sabe o que é, já que não é feita pelas pessoas que a aturam e sustentam? O que é isso, Portugal, se não nós e sem nós para que serve?
Enfim, dúvidas e mais dúvidas. Mas fiquei sossegad@ numa coisa: teremos a benção de uma política peniana nos próximos anos. O que, confessem, é bastante mais tranquilizante do que se fosse clitoriana, dEus nos livre! Sim, porque está na altura, meu caro Portugal, de deixares de ter pena de ti mesmo, de largares o sofá da conversa, arregaçares as mangas e enfrentares a vida como ela é. E para isto o que aí vem não podia sair-nos melhor, porque como tão bem nos recorda o Abominável Coiso das Neves, As crises são para os homens.
E ponto final.
Muito se tem falado pela blogosfera, nomeadamente nas referências que são o pasto das renas, os nossos tempos e a casa do cacau, sobre o que nesta última se apelidou de política peniana. A este propósito andei a aconselhar vivamente a leitura do artigo de Ana Sá Lopes no Público de ontem. Mas juro que não fiz por mal. Eu pensava que sabia o que pensava. Só hoje lendo o Diário de Notícias percebi que pensava mal.
Percebi finalmente que se estamos hoje como estamos neste país é só porque emborcámos grades de subsídios, apoios, benefícios, incentivos, sem reparar que é com o teu dinheiro que te dão isso. Gastaste anos com parvoíces, como o aborto e a regionalização; deitaste-te tarde a ver a ficção dos reality shows. Depois admiras-te que os parceiros te passem à frente e não tenhas produtividade. Acreditaste nos que te falavam em reduções de horário de trabalho e salários europeus, sem ver que esses países os têm porque trabalham muito para o conseguir. Quiseste fazer estádios e andar nas ruas a abanar bandeirinhas.
Ora aqui @ tenrinh@ nunca se tinha apercebido de que os mais activos defensores da legalização do aborto ou da regionalização [vá lá, os direitos lgbt ficaram de fora das parvoíces, desta vez] fossem precisamente os engrossadores das reais audiências, ora aí está uma novidade. Outra novidade é que tudo isto esteja, para o Abominável Coiso das Neves, directamente ligado ao progresso. Mas esses países mais avançados são, em geral, muito mais liberais em termos de políticas sexuais e reprodutivas, muito mais descentralizados e económicos - no sentido inteligente do termo, não no sentido salazarento - do que o nosso. Então temos aqui um problema: ou eu ou o Coiso das Neves, um de nós vive num mundo paralelo. Por favor, alguém que me tire desta angústia!
Mas o que me deixou mais angustiad@ ainda foi a conclusão deste Não há almoços grátis, novamente um texto com o interesse e a qualidade de uma redacção do ciclo preparatório [partindo do princípio de que falamos de um aluno acima da média, claro...]:
FAZ! Como sempre soubeste fazer. Não por ti, meu caro Portugal, mas pelos portugueses. E deixa dar-te uma novidade não há cá mais ninguém. Só tu, Portugal, podes fazer o desenvolvimento português. Mais ninguém. Os outros falam. Tu ainda cá andarás depois de eles se calarem.
Não há cá mais ninguém, só tu, Portugal? Alguém me explica o que ele quer dizer com isto? Os outros são quem, os estrangeiros? Os que não concordam com o Coiso? Portanto eu sou os outros, logo não faço parte de Portugal? Ou fala-se realmente dessa bela e velha ideia abstracta de Nação que ninguém sabe o que é, já que não é feita pelas pessoas que a aturam e sustentam? O que é isso, Portugal, se não nós e sem nós para que serve?
Enfim, dúvidas e mais dúvidas. Mas fiquei sossegad@ numa coisa: teremos a benção de uma política peniana nos próximos anos. O que, confessem, é bastante mais tranquilizante do que se fosse clitoriana, dEus nos livre! Sim, porque está na altura, meu caro Portugal, de deixares de ter pena de ti mesmo, de largares o sofá da conversa, arregaçares as mangas e enfrentares a vida como ela é. E para isto o que aí vem não podia sair-nos melhor, porque como tão bem nos recorda o Abominável Coiso das Neves, As crises são para os homens.
E ponto final.
Lei de Murphy aplicada às mudanças de casa
Quanto maior for o número de cabides com roupa que se carregam, e sobretudo quanto maior for o número de peças de roupa que já estão a escorregar, maiores são as probabilidades de faltar a luz e se ficar fechado no elevador até que o senhor que está a almoçar na Brandoa e que "só demora cinco minutinhos" venha tirar-nos de lá.
Trust me.
Quanto maior for o número de cabides com roupa que se carregam, e sobretudo quanto maior for o número de peças de roupa que já estão a escorregar, maiores são as probabilidades de faltar a luz e se ficar fechado no elevador até que o senhor que está a almoçar na Brandoa e que "só demora cinco minutinhos" venha tirar-nos de lá.
Trust me.
domingo, janeiro 09, 2005
Masoquismos II
Mas um breve olhar para dentro do saquinho tão diligentemente para mim estendido à saída do concerto de encerramento do Festival de Música de S.Roque de 2004 deixou-me com a sensação de que a colecta não foi muito frutífera. Bom, há várias explicações possíveis. Entre muitas outras, a primeira e mais óbvia é a de que acabámos de sair do Natal, naturalmente bem menos abonados do que entrámos. Mas veio-me logo uma segunda explicação à cabeça: temos todos estado concentrados na Ásia, contribuindo o mais possível para algo que nos afecta muito profundamente, para uma tragédia que nos choca na sua transcendente, esmagadora e mortal imprevisibilidade. O que me deixa a pensar: afinal Alá não lançou o cataclismo sobre as dissolutas estâncias balneares por causa da preversão e da homossexualidade, como afirma este senhor*, antes a tê-lo feito foi numa inteligente estratégia de desestabilização do mercado da fé e da caridade. Xeque!
*via Renas e Resistente
Mas um breve olhar para dentro do saquinho tão diligentemente para mim estendido à saída do concerto de encerramento do Festival de Música de S.Roque de 2004 deixou-me com a sensação de que a colecta não foi muito frutífera. Bom, há várias explicações possíveis. Entre muitas outras, a primeira e mais óbvia é a de que acabámos de sair do Natal, naturalmente bem menos abonados do que entrámos. Mas veio-me logo uma segunda explicação à cabeça: temos todos estado concentrados na Ásia, contribuindo o mais possível para algo que nos afecta muito profundamente, para uma tragédia que nos choca na sua transcendente, esmagadora e mortal imprevisibilidade. O que me deixa a pensar: afinal Alá não lançou o cataclismo sobre as dissolutas estâncias balneares por causa da preversão e da homossexualidade, como afirma este senhor*, antes a tê-lo feito foi numa inteligente estratégia de desestabilização do mercado da fé e da caridade. Xeque!
*via Renas e Resistente
Masoquismos
Ontem, já no estrado e preprarad@ para cantar, é que descobri que estava integrad@ no coro da Fundação Ajuda à Igreja Que Sofre. Fundação essa cujos voluntários [suponho que o sejam, mas eu sou um bocadinho ingénu@ nestas coisas] às portas de São Roque estendiam ostensivamente os saquinhos de veludo vermelho, atravancando a saída do público numa espécie de portagem mal disfarçada.
Eu cá só pergunto uma coisa: então mas ninguém abre uma contazita à Igreja Que Sofre no Banco Ambrosiano? Família mais desgarrada, pá...
Ontem, já no estrado e preprarad@ para cantar, é que descobri que estava integrad@ no coro da Fundação Ajuda à Igreja Que Sofre. Fundação essa cujos voluntários [suponho que o sejam, mas eu sou um bocadinho ingénu@ nestas coisas] às portas de São Roque estendiam ostensivamente os saquinhos de veludo vermelho, atravancando a saída do público numa espécie de portagem mal disfarçada.
Eu cá só pergunto uma coisa: então mas ninguém abre uma contazita à Igreja Que Sofre no Banco Ambrosiano? Família mais desgarrada, pá...
sexta-feira, janeiro 07, 2005
Parabéns, minha Rita.
E bem-vinda à segunda maioridade. Que te abra mais portas para continuares a crescer, que te areie bem os espelhos para saberes quem és, que te dê força para procurar e discernimento para receber o vinho da vida - ou se preferires a ginja, que, como está mais que provado, não bate. Um grande, grande beijo, minha amiga linda.
Ultrabiográfico
Por um mistério de cerejeira
Subiu a terra. Floriu em mim.
Ah, não ser eu a trepadeira
Com que cheguei ao meu jardim!
Uma gaivota como alimento
Se é ser gaivota voar assim
Nesta voluta de alheamento
De carga de ouro dum bergantim.
Se houver raiz ela é por dentro
Que a minha raça é ser por fora
A esmeralda em que concentro
Um linhagem que me devora.
Pela teoria de um instrumento
De sete cordas ou de nenhuma,
Sou uma frase escrita pelo vento
Numa parede como a bruma.
Que sexta-feira de estilhaços!
(na via-sacra é a paixão)
Se já morri foi nos meus braços
Por não haver ressurreição.
Cheguei a esta mitologia
Como os ciganos, pelo caminho.
Na minha humana eucaristia
Não há o pão. Só bebo o vinho.
Deixem ao céu a concordata
Com uma flor, se lhe apetece.
Mas não me mostrem santos de prata
Como quem mostra o que padece.
Para Jeová, sofro de mais.
Para o demónio, sofro de menos.
Prefiro os olhos dos animais
E o meu vestido de ver a Vénus.
Natália Correia, in Passaporte
E bem-vinda à segunda maioridade. Que te abra mais portas para continuares a crescer, que te areie bem os espelhos para saberes quem és, que te dê força para procurar e discernimento para receber o vinho da vida - ou se preferires a ginja, que, como está mais que provado, não bate. Um grande, grande beijo, minha amiga linda.
Ultrabiográfico
Por um mistério de cerejeira
Subiu a terra. Floriu em mim.
Ah, não ser eu a trepadeira
Com que cheguei ao meu jardim!
Uma gaivota como alimento
Se é ser gaivota voar assim
Nesta voluta de alheamento
De carga de ouro dum bergantim.
Se houver raiz ela é por dentro
Que a minha raça é ser por fora
A esmeralda em que concentro
Um linhagem que me devora.
Pela teoria de um instrumento
De sete cordas ou de nenhuma,
Sou uma frase escrita pelo vento
Numa parede como a bruma.
Que sexta-feira de estilhaços!
(na via-sacra é a paixão)
Se já morri foi nos meus braços
Por não haver ressurreição.
Cheguei a esta mitologia
Como os ciganos, pelo caminho.
Na minha humana eucaristia
Não há o pão. Só bebo o vinho.
Deixem ao céu a concordata
Com uma flor, se lhe apetece.
Mas não me mostrem santos de prata
Como quem mostra o que padece.
Para Jeová, sofro de mais.
Para o demónio, sofro de menos.
Prefiro os olhos dos animais
E o meu vestido de ver a Vénus.
Natália Correia, in Passaporte
quinta-feira, janeiro 06, 2005
E ainda nos dizem para confiar no sistema de saúde, livra!
Dia preenchido que exigiu que trocasse o metro pelo automóvel. Deixo passar uma ambulância e quando tomo o meu lugar no trânsito atrás dela até me arrepio: SADOMACAS?!? Livra, isto um gajo não pode ficar doente em Setúbal, que leva logo com umas chibatadas, esteja para aí virado ou não...
Sempre podíamos tentar que esta empresa patrocinasse o nosso Spanking Patridiótico.
Dia preenchido que exigiu que trocasse o metro pelo automóvel. Deixo passar uma ambulância e quando tomo o meu lugar no trânsito atrás dela até me arrepio: SADOMACAS?!? Livra, isto um gajo não pode ficar doente em Setúbal, que leva logo com umas chibatadas, esteja para aí virado ou não...
Sempre podíamos tentar que esta empresa patrocinasse o nosso Spanking Patridiótico.
quarta-feira, janeiro 05, 2005
Portas lança novo método de justificação de faltas
Variantes do "não posso ir porque estou doente e tenho outras coisas para fazer":
a) houve greve de transportes e tive uma consulta no médico;
b) o elevador do meu prédio ficou parado entre dois andares o dia inteiro e o cão engoliu as chaves de casa por isso não pude sair;
c) fiquei de cama com febre e tive de levar o cão ao veterinário.
Variantes do "não posso ir porque estou doente e tenho outras coisas para fazer":
a) houve greve de transportes e tive uma consulta no médico;
b) o elevador do meu prédio ficou parado entre dois andares o dia inteiro e o cão engoliu as chaves de casa por isso não pude sair;
c) fiquei de cama com febre e tive de levar o cão ao veterinário.
Nada regenera uma nação como uma medonha tareia... Oh! Deus de Ourique, manda-nos o castelhano!
Assim o disse o Eça, pela voz de João da Ega. E como se pode comprovar até por uma leitura diagonal [ou marcelista, como quiserem...] desta belíssima reedição d'As Farpas que anda agora a circular, Portugal mantém-se fiel à velha máxima de que o que é bom nunca muda... e o que é mau ainda menos. Assim, e aproveitando a sugestão da nossa amada Tiazona, aqui fica o desafio para um bom spanking nacional, a ser organizado em comissão numa reunião secreta a ter lugar para meados deste mês ali para os lados da Penha de França.
As inscrições estão abertas. É importante que se pronunciem, para termos noção do contingente espancatório de que disporemos para esta operação inadiável, de alto cariz patriótico [ou patridiótico, como preferirem]. O dever chama-nos, senhores! Não lhe voltemos as costas! Ofereçamos belas tareias a quem delas desesperadamente precisa. Eu sugiro que se comece por aqui.
Assim o disse o Eça, pela voz de João da Ega. E como se pode comprovar até por uma leitura diagonal [ou marcelista, como quiserem...] desta belíssima reedição d'As Farpas que anda agora a circular, Portugal mantém-se fiel à velha máxima de que o que é bom nunca muda... e o que é mau ainda menos. Assim, e aproveitando a sugestão da nossa amada Tiazona, aqui fica o desafio para um bom spanking nacional, a ser organizado em comissão numa reunião secreta a ter lugar para meados deste mês ali para os lados da Penha de França.
As inscrições estão abertas. É importante que se pronunciem, para termos noção do contingente espancatório de que disporemos para esta operação inadiável, de alto cariz patriótico [ou patridiótico, como preferirem]. O dever chama-nos, senhores! Não lhe voltemos as costas! Ofereçamos belas tareias a quem delas desesperadamente precisa. Eu sugiro que se comece por aqui.
terça-feira, janeiro 04, 2005
Mudança de casa - III
[Laranja mentaliza-se: "isto é tudo muito simples, não há que enganar, vá, é desta"]
"Muito bom dia, eu queria instalar tv cabo e netcabo em minha casa. Não sei se algum dos seus colegas já inseriu os meus dados no computador, porque já não é a primeira vez que ligo, mas preferia começar do início, se fosse posível." "Não se preocupe, tratamos já disso! Temos o maior prazer [blá blá blá= conversa sedativa para que o cliente, a seguir, diga a tudo que sim.] os seus dados, por favor? Nome? Morada? BI? Contribuinte?... [pausa] Espere lá, a sua morada não é esta!" "Agora é." "Mas não é isso que eu tenho aqui!" "Pois, lamento, mas agora é." "Hmmm... [quase ouvi o senhor da tv cabo a fazer trombas]. Dê-me só um momento, por favor".
[20 minutos depois - que dão para ouvir o mesmo bocadinho da "Primavera", das "Quatro Estações" de Vivaldi 5.876 vezes...]
"Lamento, mas não vai dar. O sistema está a migrar. Um bom dia para si."
Para o sul, talvez, por causa do frio? Migrem-me também, se faz favor...
[Laranja mentaliza-se: "isto é tudo muito simples, não há que enganar, vá, é desta"]
"Muito bom dia, eu queria instalar tv cabo e netcabo em minha casa. Não sei se algum dos seus colegas já inseriu os meus dados no computador, porque já não é a primeira vez que ligo, mas preferia começar do início, se fosse posível." "Não se preocupe, tratamos já disso! Temos o maior prazer [blá blá blá= conversa sedativa para que o cliente, a seguir, diga a tudo que sim.] os seus dados, por favor? Nome? Morada? BI? Contribuinte?... [pausa] Espere lá, a sua morada não é esta!" "Agora é." "Mas não é isso que eu tenho aqui!" "Pois, lamento, mas agora é." "Hmmm... [quase ouvi o senhor da tv cabo a fazer trombas]. Dê-me só um momento, por favor".
[20 minutos depois - que dão para ouvir o mesmo bocadinho da "Primavera", das "Quatro Estações" de Vivaldi 5.876 vezes...]
"Lamento, mas não vai dar. O sistema está a migrar. Um bom dia para si."
Para o sul, talvez, por causa do frio? Migrem-me também, se faz favor...
segunda-feira, janeiro 03, 2005
O Peter Pan afinal é um adulto!
Peter Pan, Kensigton Gardens
Londres, Agosto de 1998
Fotografia de Manel da Truta
Internem-me, se quiserem, mas acho que Finding Neverland é dos filmes mais realistas que já vi. Um Johnny Depp seráfico e com os olhos a transbordar de ternura e abandono [sendo esse olhar de abandono explicado numa breve cena] é John Barrie, o autor de Peter Pan, e Kate Winslet uma inteligentíssima, lindíssima, sensualíssima e secretamente doente mãe de Peter Llewelyn Davies, o menino que desde a morte do pai queria crescer depressa demais. Talvez porque pensasse que os adultos sofrem menos quando perdem alguém, como Barrie sugere. Talvez porque achasse que aos adultos ninguém mente como às crianças, como sugere o filme. Talvez porque sonhasse que os adultos compreendem as razões das coisas que nos acontecem, sugiro eu. Era isso que fazia dele uma criança. Só queria crescer o quanto antes porque era uma criança, fosse já um adulto e compreenderia a insensatez da sua escolha.
O filme deliciou-me especialmente por ser um ensaio em redor do que distingue adultos de crianças, ou melhor, do que significa ser adulto. A avó Julie Christie - o rosto continua o mesmo, mas as rugas enriqueceram-no espectacularmente - não é, ao contrário do que a expressão severa e segura querem fazer crer, uma adulta. Não o é, pelo menos, até ao momento em que o neto-aparentemente-ainda-criança lhe impõe os limites que ela teima em ignorar, não o é, de certeza até que bata palmas desesperada para salvar Sininho da morte no palco improvisado na sala de casa da filha. Sininho que não é Julia Roberts, naturalmente, antes não passa de um mero reflexo de luz comandado por um vulgar espelho de mão. Agora sim, Mrs. De Maurier cresceu. Quando percebeu que um adulto conhece a importância do afecto, da imaginação, da generosidade e só uma criança mimada pode dar menos importância a estas coisas do que às aparências, à sociedade, ao estatuto. Tudo brincadeiras de adultos, cheias de regras e disciplina mas com metade da graça, so what's the point? Que infantil desperdício de tempo que é a vida adulta.
Mas este John Barrie não tem qualquer tipo de inclinação para a infantilidade, para o alimentar de uma menoridade nas crianças. Pelo contrário, é inesquecível a cena em que Barrie testemunha deslumbrado aquilo a que ele chama a passagem para a idade adulta de George, o mais velho dos quatro irmãos. Inesquecível também pela sequência, já que na cena seguinte George experimenta o mecanismo de vôo do Duke of York Theatre, que se prepara para estrear Peter Pan, pairando sobre o palco com o seu corpo ainda pequeno e leve e o seu riso infantil. O teatro, o aquário onde conservamos tudo o que é bom e fresco da nossa infância, o sininho que nos recorda que não podemos ser adultos se deixarmos algum dia de ser crianças.
Peter Pan, Kensigton Gardens
Londres, Agosto de 1998
Fotografia de Manel da Truta
Internem-me, se quiserem, mas acho que Finding Neverland é dos filmes mais realistas que já vi. Um Johnny Depp seráfico e com os olhos a transbordar de ternura e abandono [sendo esse olhar de abandono explicado numa breve cena] é John Barrie, o autor de Peter Pan, e Kate Winslet uma inteligentíssima, lindíssima, sensualíssima e secretamente doente mãe de Peter Llewelyn Davies, o menino que desde a morte do pai queria crescer depressa demais. Talvez porque pensasse que os adultos sofrem menos quando perdem alguém, como Barrie sugere. Talvez porque achasse que aos adultos ninguém mente como às crianças, como sugere o filme. Talvez porque sonhasse que os adultos compreendem as razões das coisas que nos acontecem, sugiro eu. Era isso que fazia dele uma criança. Só queria crescer o quanto antes porque era uma criança, fosse já um adulto e compreenderia a insensatez da sua escolha.
O filme deliciou-me especialmente por ser um ensaio em redor do que distingue adultos de crianças, ou melhor, do que significa ser adulto. A avó Julie Christie - o rosto continua o mesmo, mas as rugas enriqueceram-no espectacularmente - não é, ao contrário do que a expressão severa e segura querem fazer crer, uma adulta. Não o é, pelo menos, até ao momento em que o neto-aparentemente-ainda-criança lhe impõe os limites que ela teima em ignorar, não o é, de certeza até que bata palmas desesperada para salvar Sininho da morte no palco improvisado na sala de casa da filha. Sininho que não é Julia Roberts, naturalmente, antes não passa de um mero reflexo de luz comandado por um vulgar espelho de mão. Agora sim, Mrs. De Maurier cresceu. Quando percebeu que um adulto conhece a importância do afecto, da imaginação, da generosidade e só uma criança mimada pode dar menos importância a estas coisas do que às aparências, à sociedade, ao estatuto. Tudo brincadeiras de adultos, cheias de regras e disciplina mas com metade da graça, so what's the point? Que infantil desperdício de tempo que é a vida adulta.
Mas este John Barrie não tem qualquer tipo de inclinação para a infantilidade, para o alimentar de uma menoridade nas crianças. Pelo contrário, é inesquecível a cena em que Barrie testemunha deslumbrado aquilo a que ele chama a passagem para a idade adulta de George, o mais velho dos quatro irmãos. Inesquecível também pela sequência, já que na cena seguinte George experimenta o mecanismo de vôo do Duke of York Theatre, que se prepara para estrear Peter Pan, pairando sobre o palco com o seu corpo ainda pequeno e leve e o seu riso infantil. O teatro, o aquário onde conservamos tudo o que é bom e fresco da nossa infância, o sininho que nos recorda que não podemos ser adultos se deixarmos algum dia de ser crianças.
domingo, janeiro 02, 2005
Que encontres o Caminho. Já lá estás, embora ainda não o saibas. E não deixes traços de teres entrado...
Leave your troubles... outside. So, life is disapointing, han? Forget it! In here, life is beautiful, the girls are beautiful, even the orchestra is beautiful! Wilkommen, bienvenue, welcome, fremde, étranger, stranger. Glücklich, zu sehen! Je suis enchanté! Happy to see you! Bleibe reste stay!
A feiticeira dos longos caracóis escuros passou, como todos aguardavam, o seu caldeirão. E mais um novo ano começou na casa mais linda do mundo com a partilha do que de mais valioso cada um tinha levado consigo: os desejos, os anseios, as vontades, os afectos. Coisas estranhas sucedem sempre neste ritual. Há um ano veio para as minhas mãos um papel em que li o que escrevera para deitar no caldeirão. Um desejo tão abstracto que lá cabe qualquer coisa. Mas a letra não era minha. Será que era de quem leu o meu desejo? Não sei, achei melhor não tirar a limpo.
Muda de vida se tu não viveres satisfeito/muda de vida estás sempre a tempo de mudar/muda de vida não deves viver contrafeito/muda de vida se há vida em ti a latejar.
Aos vários anciãos da tribo, invariavelmente, calham desejos de sexo, muito sexo, mais sexo e ainda mais sexo, a um dos mais jovens a sorte entregou o desejo de que este ano não seja o último. Alguém com questões de gosto sexual para resolver [acho que me identifico mais com esta expressão do que com "orientação sexual" -aliás, a minha orientação deve ser a oeste, já que nunca como nos Açores fiz tanto amor em tão pouco tempo], alguém a braços com um doce dilema, dizia eu, escreveu, ao invés de um desejo, uma pergunta à querida Maria: gosto do professor, mas também gosto da professora. O que é que eu faço?
Get off/twenty two positions in a one night stand/Get off/I'll only call you after if you say I can/Get off/Let a woman be a woman and a man be a man/Get off/If you want me baby, here I am.
O largo círculo vai prosseguindo e assistir às perplexidades de cada um ao ler o que o caldeirão lhe deu é um espectáculo diverso e apaixonante. A minha perplexidade não é pequena, o que leio atinge-me em cheio. Nesse momento ainda nem sei que saíu da mão de alguém que encontrei no ano que passou embora nos conhecêssemos há já vários anos, alguém com quem no palco partilhei momentos muito bonitos e emoções verdadeiras. Coincidências... felizes e significativas coincidências.
Tempestades que não param/ Pára-raios quem não tem?/Mesmo que não venha o trem não posso parar.
Esta noite, o que é? Danças e gritos. Música e balões. Comida, álcool e tabaco, com ou sem mistura.
When all else fails and you long to be/Something better than you are today/I know a place where you can get away/It's called a dance floor/and here's what it's for/so come on, vogue/let yout body move to the music/come on, vogue/let your body go with the flow/you know you can do it.
Gente e expectativa. Bichos e calor. Beijos e abraços, risos e canções. Energia e cansaço.
Oh no, not I, I will survive, oh as long as I know how to love I know I'm still alive!
E mascarados que ainda chegam às sete e meia para apagar os fogos que trazem da noite do Lux, gastando os últimos cartuchos de energia enquanto os olhos se avermelham e a voz vai suavizando e adormecendo. E frente à cinematográfica janela, conversas à lareira com o sol iluminando aos poucos a densa névoa do Oeste. Bom ano, Thara, Gátia, Índia, Pintas. Bom ano, amigos queridos. Bom ano, casa mais linda do mundo.
Leave your troubles... outside. So, life is disapointing, han? Forget it! In here, life is beautiful, the girls are beautiful, even the orchestra is beautiful! Wilkommen, bienvenue, welcome, fremde, étranger, stranger. Glücklich, zu sehen! Je suis enchanté! Happy to see you! Bleibe reste stay!
A feiticeira dos longos caracóis escuros passou, como todos aguardavam, o seu caldeirão. E mais um novo ano começou na casa mais linda do mundo com a partilha do que de mais valioso cada um tinha levado consigo: os desejos, os anseios, as vontades, os afectos. Coisas estranhas sucedem sempre neste ritual. Há um ano veio para as minhas mãos um papel em que li o que escrevera para deitar no caldeirão. Um desejo tão abstracto que lá cabe qualquer coisa. Mas a letra não era minha. Será que era de quem leu o meu desejo? Não sei, achei melhor não tirar a limpo.
Muda de vida se tu não viveres satisfeito/muda de vida estás sempre a tempo de mudar/muda de vida não deves viver contrafeito/muda de vida se há vida em ti a latejar.
Aos vários anciãos da tribo, invariavelmente, calham desejos de sexo, muito sexo, mais sexo e ainda mais sexo, a um dos mais jovens a sorte entregou o desejo de que este ano não seja o último. Alguém com questões de gosto sexual para resolver [acho que me identifico mais com esta expressão do que com "orientação sexual" -aliás, a minha orientação deve ser a oeste, já que nunca como nos Açores fiz tanto amor em tão pouco tempo], alguém a braços com um doce dilema, dizia eu, escreveu, ao invés de um desejo, uma pergunta à querida Maria: gosto do professor, mas também gosto da professora. O que é que eu faço?
Get off/twenty two positions in a one night stand/Get off/I'll only call you after if you say I can/Get off/Let a woman be a woman and a man be a man/Get off/If you want me baby, here I am.
O largo círculo vai prosseguindo e assistir às perplexidades de cada um ao ler o que o caldeirão lhe deu é um espectáculo diverso e apaixonante. A minha perplexidade não é pequena, o que leio atinge-me em cheio. Nesse momento ainda nem sei que saíu da mão de alguém que encontrei no ano que passou embora nos conhecêssemos há já vários anos, alguém com quem no palco partilhei momentos muito bonitos e emoções verdadeiras. Coincidências... felizes e significativas coincidências.
Tempestades que não param/ Pára-raios quem não tem?/Mesmo que não venha o trem não posso parar.
Esta noite, o que é? Danças e gritos. Música e balões. Comida, álcool e tabaco, com ou sem mistura.
When all else fails and you long to be/Something better than you are today/I know a place where you can get away/It's called a dance floor/and here's what it's for/so come on, vogue/let yout body move to the music/come on, vogue/let your body go with the flow/you know you can do it.
Gente e expectativa. Bichos e calor. Beijos e abraços, risos e canções. Energia e cansaço.
Oh no, not I, I will survive, oh as long as I know how to love I know I'm still alive!
E mascarados que ainda chegam às sete e meia para apagar os fogos que trazem da noite do Lux, gastando os últimos cartuchos de energia enquanto os olhos se avermelham e a voz vai suavizando e adormecendo. E frente à cinematográfica janela, conversas à lareira com o sol iluminando aos poucos a densa névoa do Oeste. Bom ano, Thara, Gátia, Índia, Pintas. Bom ano, amigos queridos. Bom ano, casa mais linda do mundo.